Na tarde desta terça-feira (12/06), o presidente da Associação dos Catadores do Jardim Gramacho (ACAMJG) e representante do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), Sebastião Santos, conhecido mundialmente por sua participação no filme “Lixo Extraordinário”, proferiu uma palestra sobre “Sustentabilidade, Reciclagem e Responsabilidade Social” para funcionários e executivos da OSX na Unidade de Construção Naval (UCN) do Porto do Açu.
Diante de centenas de pessoas, ‘Tião’ falou sobre sua vivência no recém-fechado Aterro Controlado de Jardim Gramacho e inspirou a todos a buscarem um novo olhar sobre o descarte de materiais que afetam o planeta. Membro de uma terceira geração de catadores, ele explicou que reciclar, além de ser uma excelente fonte de renda para milhares de famílias, é uma atitude individual para o bem estar de todos no planeta.
“Cerca de R$ 8 bilhões são desperdiçados ao ano por conta do não tratamento de resíduos recicláveis no Brasil. Não existe pobreza bonita e a reciclagem é um dos principais caminhos que ajudará nosso país a acabar com a exclusão. Gramacho encerrou após 34 anos, mas a gente não encerra junto e existe um longo trabalho a ser feito. A política ambiental deveria ser ensinada nas escolas e o filme foi um aliado poderoso para a causa dos catadores”, disse Tião Santos, ressaltando que a Lei sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos, aprovada em 2010 no Congresso Nacional, torna cada indivíduo, empresa e município responsável pelos resíduos que produz, assim como medidas voltadas para a área da Saúde e desenvolvimento humano, entre outras disposições.
Tião que também fará parte do conselho gestor que irá administrar o recém criado Fundo Estadual do Meio Ambiente (Fecam), que irá destinar R$ 1,4 milhão por ano aos catadores do Aterro de Gramacho, afirmou ainda que a classe trabalhadora ganhará muito com a implementação da coleta seletiva e da logística reversa.
“Com a nova Lei, cada resíduo pode ter seu destino correto e o catador trabalhar de forma adequada, digna e sem sofrer discriminação. De certa forma, somos os maiores recicladores de latas de alumínio e garrafas pet do Mundo, mas ainda falta desenvolver todo nosso potencial. Na minha opinião, a reciclagem não deixa de ser, também, uma reparação cultural, já que esta função possui raízes ainda no período da escravatura. Seja dentro de um lixão ou aterro controlado, a gente sofre todo o tipo de mazela de saúde, social, com risco constante de acidente e de ser mutilado ou morto. O sentimento que tenho com o fechamento do aterro é uma sensação de vitória e de boas perspectivas para o futuro”, afirma.
CINCO ANOS DEPOIS, ENTREVISTADOR E ENTREVISTADO SE REENCONTRAMGratidão. Este foi o meu sentimento ao reencontrar meu amigo Tião durante a sua palestra nesta segunda-feira no Porto do Açu. Mais uma vez como repórter, optei em não fazer perguntas ao meu antigo entrevistado e apenas agradeci a oportunidade de ter convivido no lixo junto aos catadores do Aterro de Gramacho por mais de um mês, nos idos de 2008, durante a pré-produção do documentário “Lixo Extraordinário”, dirigido pelos brasileiros João Jardim e Karen Harley e pela inglesa Lucy Walker e um dos indicados para ganhar o Oscar em 2010.
Surpresos pela coincidência, entre uma conversa e outra, chegamos a conclusão que todos os catadores retratados pelo artista plástico Vik Muniz no filme ‘ganharam’ o Oscar. Lembrei da coordenação da excelente jornalista Renée Castelo Branco e de todo o trabalho de pesquisa que realizamos numa das áreas mais degradas do estado do Rio. Bem ao velho estilo ‘Gonzo’ de fazer jornalismo, descrevo aqui, em primeira pessoa, que sou sinceramente grato à vida por ter podido contribuir um pouquinho para que os trabalhadores de Jardim Gramacho e suas histórias ganhassem projeção mundial. Para mim, aqueles homens e mulheres são os verdadeiros super-heróis.
Sem dúvidas, meu trabalho de pesquisa para este documentário foi o melhor trabalho que pude realizar em toda a minha vida. Ele teve a competência de materializar não só pessoas retratadas, mas sentimentos. Como o próprio Tião disse durante a sua palestra na UCN do Açu, “poucos imaginam como é a vida das pessoas que trabalham em um lixão”.
Ele está certo. São figuras humanas à margem até mesmo de nossa visão periférica, assim como suas histórias. Entretanto, estes trabalhadores possuem o poder de transformar tudo aquilo que não desejamos enxergar ao redor de nossas vidas, reciclando descaso e transformando em pura poesia. Poesias em forma de gente que mudaram suas próprias vidas através da superação de um enredo quase sempre sem final feliz.
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